Esta é uma peça “contra os brancos”, segundo Jean Genet. Hoje diríamos que se trata de protesto e repúdio ao “privilégio branco”, como bem confirma o personagem Missionário quando declara: “Confiai, Majestade. Deus é Branco.” E foi em nome desse Deus, mesmo que de forma instrumental, que se sublimou a superioridade e se encontrou alento e força, ausência de vergonha e de arrependimento para a instauração do Colonialismo, da Escravatura, do racismo institucional e da segregação racial. “Esta noite, o nosso único desejo é divertir-vos: matámos uma Branca”, afirma Arquibaldo. Genet pretende chocar, fazer chorar de dor, vergonha e tremor o espectador branco, colocando-o no centro da ação de forma absolutamente humilhante, cobrindo-o de ódio, medo e sensações de inferioridade, e confrontando-o com a morte, o escárnio, a desumanidade e a falta de piedade. Mas, aquilo que acontece, é que o sujeito branco é, na verdade, convidado pelo autor a salvar-se e a fazer uma purga, ao ser confrontado com a crueza da sua vantagem, com a sua maldade e com a falsidade e hipocrisia que norteiam os seus valores burgueses e coloniais, num confronto permanente entre o amor e o ódio. A peça salva quem a ela assiste. Salva os brancos, assim como Genet foi salvo graças à sua capacidade de se colocar no lugar do “outro”, e é este o exercício que o autor convida os espectadores a fazer.
O assassinato da mulher branca simboliza o fim da hegemonia colonial, que permitirá ao negro o auto-conhecimento e a auto-determinação. Ganhar vida e ganhar corpo físico, ganhar liberdade e espaço de expressão. Aos negros é-lhes pedido ação, a revolta e a insubmissão, ao mesmo tempo que o autor procura fazer parte das suas lutas e lhes reconhece a força e a capacidade de reverter a História. Ville de Saint Nazaire ironiza fazendo referência a um mundo no qual as relações de poder se encontram invertidas: “Não tentou negrificá-los? Não tentou enxertar neles as narinas e os beiços bambares? Não lhes encrespou os cabelos? Não os reduziu à escravatura?”
Ao mesmo tempo, para garantir alguma similaridade com a realidade, o autor organiza o palco em três espaços verticais onde reflete a hierarquia social, com os Negros (alegoria aos escravizados) no patamar mais baixo, a Felicidade (representado por uma mulher negra de sessenta anos) no centro e com a Corte, (composto por atores negros que usam máscaras brancas, representando os dominadores e os opressores) no patamar mais elevado.
Preço dos bilhetes 7,50€. Para crianças até aos 14 anos, estudantes e maiores de 65 anos: 5€, Desconto de 20% para compras superiores a 10 bilhetes